STM julgou tentativa de reconstrução do PCBR do primeiro preso político condenado à morte pela Ditadura, Theodomiro Romeiro dos Santos, falecido aos 70 anos em Olinda (PE):
“A situação do preso político é uma situação muito particular porque ela evolui de acordo com a evolução da situação política do país”
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=UEcywXtFbNg
Houve no julgamento da Apelação 40.656 ao STM em 1976 intensa discussão sobre a condenação de Theodomiro à pena de morte, com lembranças e menções às acusações detalhadas, o processo está registrado e disponível no site Voz Humana com áudios de toda a sustentação oral da defesa, da acusação e da sessão secreta que deliberou resultado unânime em: https://vozhumana.com.br/apelacao-40-656-ba/
No julgamento, de 1976, o Ministério Público Militar acusava Theodomiro Romeiro e Paulo Pontes da Silva, presos na Bahia, junto a outros 11 acusados de “Reorganizar ou tentar reorganizar o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR)” crime incluído no art.43 da Lei de Segurança Nacional:
Art. 43. Reorganizar ou tentar reorganizar de fato ou de direito, ainda que sob falso nome ou forma simulada, partido político ou associação, dissolvidos por força de disposição legal ou de decisão judicial, ou que exerça atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional, ou fazê-lo funcionar, nas mesmas condições, quando legalmente suspenso:
Pena: reclusão, de 2 a 5 anos.
Em julgamento pretérito, de fevereiro 1971, os 13 réus haviam sido enquadrados no artigo 43 conforme relatado pelo representante do Ministério Público Militar em decorrência de suas “insidiosas atuações comunisantes, vinculados que eram ao Partido Comunista do Brasil, sempre objetivando subverter, entre 1968 e 1971, a ordem ou a estrutura político-social vigente em nosso país” conforme “foi apurado em competente inquérito policial”.
Cinco dos acusados estavam foragidos e um deles, Paulo Roberto Alves havia sido banido do país em “resgate à pessoa do Exmo. Sr. Embaixador da Suíça no Brasil”. Concluía o juízo da 6ª. CJM que Theodomiro dos Santos e Paulo Pontes, “réus confessos, engajados no PCBR, responsáveis pelas infrações mais graves e Natur de Assis Filho, Frederico José Meneses de Oliveira, João Luiz da Silva Ferreira e Renato Ribeiro da Costa, com “razoável parcela de culpa” embora inferior à dos primeiros apontados. Quanto aos demais “nada restara demonstrado que justificar pudesse uma decisão condenatória”.
Em outro julgamento anterior, de janeiro de 1974 o “representante do Ministério Público, após exame das provas, entendeu demonstrada a responsabilidade penal de todos os acusados” com base no artigo 43, “propondo ao Conselho a condenação dos mesmos. Por seu turno a defesa refutando o libelo, a uma só voz, entendeu precário o material de prova trazido à apelação, pugnando assim pela absolvição dos mesmos”.
Na apresentação da apelação 40.656 ao plenário do STM o Ministro presidente Nelson Sampaio Barbosa apresentou o caso lembrando que a denúncia, de 1971, “contra todos esses, diz estar plenamente configurado e comprovado através da confissão desses subversivos e terroristas, bem como de copioso material, apreendido pelos órgãos de segurança do país, o caráter global dos planos subversivos e do objetivo colimado, que são de subverter o regime e a ordem política e social dentro da estratégia e orientação do movimento comunista internacional utilizando-se das técnicas de traição e considerações geradas. O comunismo internacional como instrumento que é o da subversão, exerce a sua metastação em todos os setores da vida nacional e particularmente em nosso estado, cujos autos relatam as intensas atividades de militantes do PCBR, dissidência do PCB, na forma que se segue. Então vem a cota de cada um dos denunciados. Theodomiro, que é um dos condenados aqui, está condenado a trinta anos, que é aquele da morte do… Daquela morte lá na Bahia, está condenado a trinta anos. O Paulo Pontes parece que é prisão perpétua, tem outros… Paulo Roberto está exilado, foi trocado por um… foi mandado pra lá em troca não sei de que… ou não sei de quem, porque estava no sequestro do embaixador da Suíça. E mais alguns… Ele dá aqui a cota de cada um deles”.
Na sequência do áudio o Ministro relata ainda que havia nos autos grande volume de apreensão de material de propaganda arrecadado na residência de um dos acusados. Que havia contratos de locação de casas que serviam para “aparelhos”, que havia declarações de confissão de Theodomiro, Paulo Pontes, reconhecimento de veículos que eles se serviram, “declarações de todos eles colhidas no inquérito”. “Nos interrogatórios, o Marcos Dantas Loureiro, um dos principais, nega. Theodomiro confessa. Paulo Pontes confessa, Dirceu Ribeiro confessa em parte (…) Há uma inserção de litispendência de Theodomiro, que já estava condenado a trinta anos, mas foi rejeitada. Há testemunhas arroladas, 11 ou 12, e testemunhas de defesa umas 3 ou 4… A procuradoria insiste na capitulação no artigo 43, mantém a acusação.”
Pela defesa a Dra. Elizabeth Mish, que defendia Paulo Pontes da Silva e Maurício Anísio. Pediu de início a nulidade do processo alegando que seus clientes já estavam presos antes do início do processo. Sobre Paulo Pontes ela afirma que já havia sido condenado nesse mesmo processo, que não negava a participação no PCBR da Bahia. Disse que o processo retratava as atividades de vários membros do PCBR em Salvador, que como membros do PCBR “esses elementos assaltaram o Banco da Bahia na praça Liberdade e roubaram aquele banco com a quantia de 25 mil cruzeiros. Para esse fato foram feitos três processos, porque presos Paulo Pontes e Theodomiro… Theodomiro mata então aquele guarda, que vossa excelência já conhece, aquele fato; em que julgados ele e Paulo Pontes, Paulo Pontes eu faço uma ressalva ao ilustre relator, teria sido condenado à prisão perpétua e Theodomiro à pena de morte. Esse tribunal julgando a apelação passa a pena de Theodomiro para trinta anos e absolve Paulo Pontes. Paulo Pontes foi condenado a 17 anos pelo assalto, depois reduzida a pena a 15 anos, ocorre que estes fatos geraram três processos, um pela morte do guarda, outro pelo assalto e esse pela participação no PCBR. O crime maior absolve o menor, então não é justo que ele já condenado a 15 anos pelo processo do Banco através da organização que ele seja condenado em outro processo pela participação na mesma organização”. Então a defesa pedia absolvição de Paulo Pontes.
O Dr. José Moura Rocha, defensor de Theodomiro, afirmou que a “litispendência que foi sistematicamente sustentada transformou-se em coisa julgada, porque condenado à pena de morte, vendo afinal essa pena ser reduzida ou transformada em prisão perpétua, e depois no Supremo, por derradeiro, fixada em trinta anos de reclusão. Porque agira por facciosismo político. A denúncia deste processo com certa dose, data vênia, de inépcia, diz que os fatos ocorreram entre 1967 e 1971, ora, o triste episódio criminoso em que se viu envolvido Theodomiro foi em 1970! A denúncia não pode descrever com essas generalidades e de forma nebulosa, uma atuação criminosa que a lei impõe ser qualificada, minuciosa, determinada, exata! Rigorosa. Por isso a defesa sempre sustentou durante a instrução a litispendência, que já havia em relação a Theodomiro coisa julgada, os fatos eram os mesmos. E há algo eminentemente sintomático egrégio tribunal, não pode passar à perspicácia e à experiência dos julgadores, do quilate de vossas excelências, que Theodomiro fosse condenado num processo desse a dois anos! Não é porque o Conselho foi benevolente, é porque o Conselho, data máxima vênia, foi assaltado naturalmente por uma reserva… Estava o condenando pelo mesmo crime pela segunda vez! Senão Theodomiro não pegaria dois anos de reclusão, egrégia corte. É esta a observação. Se não escapa à perspicácia de um advogado de pouca experiência, se pede que não escape à perspicácia de magistrados e julgadores tão experimentados.”
O Procurador Rui de Lima Pessoa afirmou então que a preliminar que arguia a coisa julgada era uma preliminar importante, de importância jurídica, mas que essa preliminar não deveria prevalecer. “Porque eles foram, Paulo Pontes e Theodomiro Romeiro da Silva, protagonistas daquele fato lamentável ocorrido em uma das ruas da cidade de Salvador, onde perdeu a vida o sargento Xavier, da Aeronáutica. Conheci o sargento Xavier não apenas como um homem, mas também como militar. E durante a revolução Sr. Presidente, Srs. Ministros, ele prestou serviços não somente à Aeronáutica mas à Secretaria de Segurança Pública porque ele estava à disposição da Delegacia Auxiliar justamente no combate à subversão. Ali ele continuou o combate à subversão e no combate à subversão ele veio a perder a vida de uma maneira trágica e bárbara porque foi a traição! Recebeu um tiro pelas costas! Um tiro na nuca dado por esse… acusado Theodomiro Romeiro dos Santos. É um caso que já foi julgado, esse sim, é que é o caso que já foi julgado. Porque ele veio condenado à pena de morte, Sr. Presidente, Srs. Ministros, condenado à pena de morte como incurso na sanção do artigo 33 da atual Lei de Segurança Nacional, exercer violência por motivo de facciosismo ou inconformismo político-social contra quem exerça autoridade, se da violência resultar morte: prisão perpétua em grau mínimo e morte em grau máximo. Foi o último parecer dado pelo eminente Ministro Jacy Guimarães Pinheiro quando ele foi Procurador Geral da Justiça Militar em 1971. No último parecer de Vossa Excelência, V. Excl. até pediu a absolvição dizendo que não havia a coautoria. Porque houve… porque esse caso aqui suscitou uma polêmica porque esse Theodomiro, juntamente com Paulo Pontes da Silva foram presos quando haviam assaltado um banco e a polícia estava no encalço deles. E prenderam os dois. Mas justamente porque tinha um terceiro houve um descuido do sargento Xavier, em vez de recolher a pasta que estava na mão de Theodomiro, deixou a pasta e foi no encalço, deixou que o jipe seguisse no encalço de um terceiro que teria participado desse assalto. No trajeto o Theodomiro abriu a pasta, tirou o revólver e atirou no sargento que teve a morte anunciada por um tiro dado pelas costas. Como o Paulo Pontes da Silva estava algemado ao Theodomiro, então foi denunciado como coparticipe, coautor, e lembro-me bem, porque foi um dos primeiros casos em que funcionei aqui como Procurador Geral, tive a honra de substituir o Sr. Ministro Jacy Guimarães Pinto, e lembro-me bem que o Ministro Alcides Carneiro quando proferiu seu voto condenando o Theodomiro à prisão perpétua, e posteriormente no Supremo Tribunal federal essa prisão perpétua foi transformada em trinta anos. E o primeiro voto que foi dado aqui sobre essa transformação foi do Ministro Jurandir Mamede, logo depois o Ministro Augusto Fragoso também seguiu essa orientação, e ao final Theodomiro, através de um recurso obteve a transformação da pena perpétua em trinta anos. E o Paulo Pontes da Silva foi absolvido por inexistir coautoria. E lembro-me bem do voto do eminente Ministro Alcides Carneiro porque o relator citou o eminente professor e ministro Nelson Hungria. A defesa também citou Nelson Hungria em favor de sua tese. E nós aqui da Procuradoria também citamos Nelson Hungria para justificar a coautoria, que afinal não foi vencedora, a coautoria caiu.(…) Mas estou lembrando apenas para demonstrar que não há coisa julgada, ele foi julgado no artigo 33 pela conotação política, que ele sendo um elemento subversivo, pertencendo a uma organização que a polícia na época não sabia qual era. Se era o Partido Comunista Brasileiro ou se era outra dissidência do partido, aquelas dezenas de siglas que se alcançou aí pelo Brasil afora, então ele foi julgado por esse fato. A coisa julgada Sr. Presidente, pelo artigo 153 do CPPM é bem claro, se o juiz reconhecer que o feito sob seu julgamento já foi, quanto ao fato principal, devidamente julgado, com sentença e recorrido, mandará arquivar a nova denúncia declarando a razão porque o faz. Então Sr. Presidente, o fato principal desse processo é a associação! É de organização. Eles estavam reorganizando o Partido Comunista Brasileiro, e não tem nada a ver com aquele fato, uma ação completamente estranha, em outra época, em outro lugar, em que eles foram julgados e realmente já transitou em julgado. Mas não existe coisa julgada, eles não estão aqui respondendo por aquele fato do artigo 33, eles estão aqui sendo julgados por reorganizar ou tentar reorganizar o Partido Comunista, sob falso nome, mas esse Partido Comunista Brasileiro Revolucionário não é mais do que uma nova facção do próprio Partido Comunista Brasileiro. E infelizmente Sr. Presidente e Srs. Ministros, não obstante essa preliminar que não merece prosperar data vênia do esforço que ambas as defesas fizeram, no sentido de demonstrar uma coisa julgada inexistente, data vênia não merece prosperar.(…) Mas o nosso parecer Sr Presidente, é no sentido de ser acolhida essa preliminar de anulação do feito, juntando os dois sobretudo, porque se fosse somente esse processo, poderia o tribunal examinar a possibilidade de manter a classificação da denúncia, mas acontece que surge esse outro, esse desmembramento, e nesse ponto a defesa tem suas razões. E sobretudo quanto às penas aplicadas, nós observamos aqui que as penas aplicadas a Theodomiro Romeiro dos Santos e Paulo Pontes da Silva, dois elementos já condenados na justiça militar a penas elevadíssimas, inclusive prisão perpétua, transformada em trinta anos. Então o nosso ponto de vista é no sentido de anular o feito salvo melhor entendimento dessa augusta corte”.
No momento em que o julgamento entrou em sessão secreta o áudio fica confuso em seu início, Ministros falam ao mesmo tempo dificultando a audição da discussão entre eles sobre a decisão a ser tomada. Retomada a compreensão, um deles fala que o caso trata de “comunismo mesmo”, que a nomenclatura da organização pouco importava porque se estava diante de uma ala do Partido Comunista. Que a promotoria teria considerado a pena benevolente, que o fato de terem separado o inquérito em dois processos, o que envolvia Theodomiro e Paulo, e outro que julgava em separado pela mesma acusação Maurício Anísio com pena de três anos o levava a considerar a anulação de ambos. Votando por um novo julgamento que inclua todos os denunciados em um único processo. Um segundo ministro também votou em princípio pela anulação afirmando estar o processo “cheio de anomalias, cheio de irregularidades” e que estaria um réu condenado até depois do ano 2000. Outro argumentou que o crime “é grave” e que votava pelo aumento de pena de Theodomiro e Paulo passando de 2 anos para 3 anos e meio, pelo artigo 43, os demais a dois anos e absolvendo Maurício Anísio.
Um outro ministro afirmou que Maurício Anísio estava condenado por outros crimes, inclusive um assalto a banco em Pernambuco e que no processo em tela estava acusado de aliciar Theodomiro a entrar no PCBR, e diz: “É como se Prestes se encontrasse com Marighela e dissesse que este o estava aliciando a entrar no partido…” E que teria Maurício se encontrado com um estudante, e nada mais. “Esse Theodomiro é o chefe do… E teria sido aliciado… Ou seja, há muitas dúvidas sobre esse homem (Maurício) e está condenado por outras penas até 2024.” O ambiente entre os ministros revelava a intenção de absolver Maurício corrigindo erro do processo e punir maximamente Theodomiro, “aquele da pena de morte”. Decidiram então aumentar a pena de Theodomiro e Paulo de dois para três anos e meio e aumentar de um ano para dois a pena de Natur de Assis Filho, absolvendo Maurício Anísio, por unanimidade.
Theodomiro e Paulo Pontes haviam ali sido condenados a mais três anos e meio reclusão, o tribunal do STM decidiu que considerava que reorganizar ou tentar reorganizar o PCBR “com o fim de exercer atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional constitui crime definido no art. 43”; que com base na jurisprudência e no exame dos autos “conclui-se pela responsabilidade criminal de seis dos onze acusados(…) sendo os dois primeiros réus confessos, de atividades subversivas mais intensas de que as dos quatro últimos” e que dos cinco outros acusados não havia provas que os condenassem; acordavam os ministros por unanimidade que reformando a sentença recorrida, condenar Theodomiro Romeiro dos Santos e Paulo Pontes a “Três anos e seis meses de reclusão, com a pena acessória de perda dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos conforme o art.74 da LSN” (Art. 74. O condenado à pena de reclusão por mais de dois anos fica sujeito, acessòriamente à suspensão de direitos políticos, por dois a dez anos.)
Theodomiro Romeiro dos Santos iniciou sua militância política aos 14 anos em Natal (RN) se vinculando ao PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário). Aos dezesseis já era reconhecido como militante importante da organização, e depois de se mudar para Salvador (BA) em 1969, chegou a realizar ações para o financiamento da luta armada como expropriações bancárias. Uma delas, realizada em 1969 no Banco da Bahia, de grande repercussão, o tornou procurado pela polícia.
Aos 18 anos, em 1970, quando aguardava junto a outros dois militantes um ônibus no ponto, policiais os reconheceram, um dos militantes fugiu correndo, sendo Theodomiro e Paulo capturados e algemados por uma mesma algema (cada um preso por uma das mãos). Seu companheiro Gerônimo, que fugiu correndo, foi perseguido pelos agentes da repressão incluindo um sargento da Aeronáutica de arma em punho e quando este estava mirando em Gerônimo pela janela do carro em que estavam, Theodomiro sacou um revólver guardado na pasta que levava (na perseguição a pasta havia sido lançada para trás pelo agente) no carro, e atirou contra os agentes. Dois agentes baleados, o sargento da Aeronáutica Xavier faleceu em seguida.
Preso junto ao seu companheiro Paulo Pontes e barbaramente torturado Theodomiro foi o primeiro civil a ser condenado à pena de morte no Brasil republicano. No período imediatamente posterior, Gerônimo e mais seis companheiros de militância de Theodomiro foram barbaramente assassinados em episódios que envolveram explosões de carros com granadas. (ver depoimento em https://www.youtube.com/watch?v=gLfOUtvINrA)
Mantido preso até agosto de 1979 (no presídio Lemos de Brito em Salvador, Bahia) planejou e executou uma fuga em razão da convicção de que seria morto antes da promulgação da Lei da Anistia devido à candente discussão entre os militares se incluiriam os presos que haviam realizado ações armadas na anistia ou não. Certo de sua eliminação no presídio antes da promulgação da lei (um amigo jornalista havia perguntado ‘em off’ ao então governador Antônio Carlos Magalhães se Theo sairia da prisão após a anistia. ACM não respondeu, mas teria dito que “a prisão era um lugar muito perigoso”) conseguiu fugir e durante três meses se escondendo e caminhando pelo interior da Bahia e Brasília, conseguiu sair do país e se exilar na França até 1985.
“Hoje em dia os católicos e os evangélicos criaram um bicho de sete cabeças com os comunistas. Hoje em dia se você diz que é comunista, o cara começa a te olhar como se você fosse assim, quase primo do satanás!”
Do lado de fora do presídio, raspou a barba para mudar a fisionomia e pegou um táxi até o cemitério do Campo Santo, onde encontrou outros militantes do PCBR e planejou sua fuga de Salvador. Primeiro, foi levado para uma fazenda no sul da Bahia. Depois, com o auxílio de padres jesuítas, foi abrigado para um convento na cidade de Vitória da Conquista, no sudoeste baiano. De lá, seguiu para um sítio em Bom Jesus da Lapa, cidade que fica às margens do rio São Francisco.
Theodomiro foi julgado em março de 1971 pelo Conselho Especial da Aeronáutica e acabou sendo sentenciado à morte com base em um ato institucional que permitia a pena capital em casos de “guerra externa psicológica adversa, ou revolucionária ou subversiva”. A pena, contudo, foi alterada para prisão perpétua e depois reduzida para 16 anos de prisão em regime fechado. (https://politicalivre.com.br/2023/05/theodomiro-romeiro-condenado-a-morte-pela-ditadura-morre-aos-70-anos/#gsc.tab=0)
“Depois de preso, o primeiro momento que tive a certeza de que não seria morto foi quando ouvi a sentença de morte. […] Foi a divulgação e repercussão de minha prisão que me salvou. Minha condenação à morte, eu senti, iria assumir uma dimensão muito grande, o que, de fato, aconteceu”, disse Theodomiro em 1979 em entrevista concedida ao jornalista José de Jesus Barreto.
(https://politicalivre.com.br/2023/05/theodomiro-romeiro-condenado-a-morte-pela-ditadura-morre-aos-70-anos/#gsc.tab=0)
“Quanto mais o tempo passa, menos a memória funciona e mais gente morre. Então o resgate da memória fica cada vez mais difícil.”
Acabou escolhendo a Embaixada do Vaticano, onde chegou vestido de padre, pediu uma audiência com o então núncio apostólico e avisou a imprensa. Acabou ficando na embaixada, onde chegou a receber uma correspondência com uma bomba, que acabou sendo identificada e desarmada antes de o pacote chegar em suas mãos.
Em dezembro de 1979, embarcou para o México. De lá, seguiu para o exílio em Paris, onde permaneceu até o fim da ditadura militar e a expiração da sua condenação.
Theodomiro voltou ao Brasil em 1985, fez faculdade de direito e depois acabou sendo aprovado em um concurso para juiz do Trabalho. Entre 2000 e 2004, foi presidente da Associação de Magistrados Trabalhistas. Em nota, o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região lamentou a morte do juiz aposentado. Theodomiro só obteve sua anistia em 2002!
A história do preso político é contada no livro “Galeria F”, de autoria do jornalista Emiliano José, e no documentário de mesmo nome dirigido por Emília Silveira. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, em 1995, ele disse que luta armada deveria ser esquecida “não no sentido histórico”, mas no sentido de “permitir uma convivência democrática” entre as forças que dela participaram.
“Eu nunca me acomodei, eu nunca me arrependi.., nunca! Sempre estive e ainda estou aí, brigando. De outro jeito agora, mas estou aí, nas manifestações, todas, eu vou em todas!”
Theodomiro deixou mulher, a também juíza aposentada Virgínia Lúcia de Sá Bahia, e quatro filhos: Bruno, Fernando Augusto, Mário e Camila.