Wilson Mirza
Êxito no exercício da advocacia criminal
Com a edição do Ato Institucional n.º 5, aumentaram e agravaram-se as arbitrariedades e as prisões ilegais. Ao mesmo tempo, aboliram os meios defensivos, sobretudo o habeas corpus.
Os advogados continuaram a luta na defesa das vítimas, com a mesma intrepidez. Muitos foram presos. Alguns, juristas de renome internacional.
Fui, então, informado de que o Professor Darcy Ribeiro se encontrava preso em quartel militar.
Ciente da situação existente, dirigi-me ao quartel militar, comunicando que era advogado do Professor Darcy e pretendia manter um diálogo profissional com ele.
Fui recebido por um Coronel, que, de pronto, perguntou-me se eu dispunha de ordem de “habeas corpus” determinando a libertação do professor Darcy Ribeiro ou das prerrogativas legais expedidas pela Ordem dos Advogados, que asseguravam, ao advogado, livre e reservado acesso ao cliente.
Respondi-lhe que não dispunha de tais recursos. Nem os pleiteara previamente, porque tal iniciativa constituiria uma ofensa ao militar, pressupondo-o capaz de infringir a lei.
O Coronel indagou-me, então, se eu fora visitar o professor Darcy Ribeiro, louvado apenas na sua fé de soldado. E eu confirmei.
Ele arrematou o diálogo, autorizando a entrevista.
DA GRANDEZA DA ALMA BRASILEIRA
Comunicaram-me que o Professor Darcy Ribeiro estava com câncer pulmonar e desejava retornar ao Brasil para tratamento.
Antes recusara a assistência médica oferecida, entre outros, pelos Estados Unidos da América do Norte e pela França. E, assim agia, porque poderia não sobreviver à cirurgia e, em consequência, não reveria a pátria, os familiares e os amigos.
A autoridade militar não autorizou o regresso de imediato. Só após inúmeras gestões, em diversas áreas, o retorno foi autorizado nas condições estabelecidas. Ou seja, o professor deixaria o avião antes do aeroporto, na pista onde houvesse estacionado uma viatura policial federal e onde eu já estaria para acompanhá-lo até o hospital.
No trajeto para o hospital, situado no início da Zona Sul, o Professor Darcy Ribeiro disse aos policiais que iria operar-se de câncer pulmonar e poderia não sobreviver. Antes, gostaria de rever a Praia de Copacabana, reurbanizada.
Os policiais concordaram e o Professor Darcy Ribeiro pôde realizar seu desejo, antes da hospitalização.
Tão inexcedível demonstração dos policiais sensibilizou-nos, sobretudo porque expressava a grandeza do espírito brasileiro.
O professor foi operado, retiraram-lhe o pulmão doente e ele sobreviveu, inclusive pôde participar de futuros e importantes eventos históricos.
Wilson Mirza é Advogado Criminalista, foi defensor de João Goulart, Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, entre muitos outros, durante a ditadura militar
Reprodução/Livro: ” Coragem – A Advocacia Criminal nos Anos de Chumbo “, Iniciativa: OAB e OABSP, Organização: José Mentor, Março, 2014
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